Robert Cowen

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Em entrevista, Robert Cowen, pesquisador e professor britânico convidado para o Congresso da Federação Mundial dos Colleges e Politécnicos (WFCP, na sigla em inglês), comenta a situação da educação profissional, as expectativas para o ensino profissionalizante atual e sua importância no Brasil. Ele também traça uma comparação com a tradição vigente de cursar faculdade, destaca o que vê como desafios mundiais e defende a avaliação constante para chegar à excelência, mantendo a capacidade de avaliar o que pode dar certo em outros cenários.
Organizado pelo Instituto Federal do Espírito Santo (Ifes), o Congresso Mundial da WFCP será realizado em Vitória (ES), de 23 a 25 de setembro. Cowen é um dos convidados para a mesa-redonda confirmada para a manhã de 25 de setembro, das 9 às 12 horas.

Levando em consideração a Educação Comparada, quais métodos desenvolvidos pelo Brasil na educação profissional você destaca, em relação aos sistemas educacionais de outros países? O que você considera que deve ser modificado ou aperfeiçoado?
O Brasil vem trabalhando arduamente em redes diferentes como a Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica, o Sistema S e programas dos quais o Pronatec [Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego] é o mais recente. Talvez o necessário seja uma avaliação constante e cuidadosa e, muito importante, uma mudança cultural em relação à educação técnica e profissional.

Como trabalhar a Educação Comparada no século 21 dentro da educação profissional?
Falando (devagar e cuidadosamente) e ouvindo uma variedade de vozes de todo o mundo; visitando o exterior e pensando sobre outros lugares; usando seus acadêmicos – especialmente os que estudaram fora – e realizando conferências internacionais. Entender e absorver ideias e práticas de outros países é algo mais complexo que comprar um carro importado. E muito mais caro. Não há pílulas mágicas de educação comparativa – exceto, claro, soluções que agências de testes internacionais como o Programa Internacional de Avaliação de Alunos [PISA, na sigla em inglês] oferecem.

As instituições de educação profissional capacitam para o domínio técnico e formam indivíduos pensantes. Como você acha que isso pode ser intensificado?
A resposta é: ensine tudo, menos técnica. A segunda resposta tradicional é mostrar aos técnicos como o trabalho deles é político e social (além de técnico). De qualquer forma, todos os técnicos sérios e experientes, rápida ou lentamente, descobrem isto: as implicações sociais do trabalho se tornam claras para eles e passam a fazer parte da sua sabedoria.

Ao concluir o ensino médio, os jovens ainda têm a tendência de ingressar em universidades. O que fazer para desenvolver a valorização da formação profissional, especialmente na cultura brasileira?
Reequilibrando o retorno financeiro das diferentes profissões; pagando menos aos advogados, jornalistas, economistas etc. Claro que não se pode fazer isso, pelo menos não rapidamente. Você consegue boas profissões através de longas e lentas mudanças culturais historicamente importantes, pois a cultura e a economia, aos poucos, reavaliam certos tipos de trabalho.
É um processo lento – levou três décadas, desde Margareth Thatcher, para persuadir os jovens na Inglaterra de que trabalhar em negócios e, até mesmo, como eletricista ou encanador não era imoral.
Pergunte a si mesmo em quais sociedades aqueles com ‘treinamento profissional’ são altamente valorizados. Por que? E se você pensar que isso é uma ‘solução’, você está apenas começando. A questão não é ‘o que funciona lá’, mas entender a sociologia, a história e a economia que fazem ‘funcionar lá’ e então fazer a pergunta crucial: como isso se transfere para o Brasil e o que precisa ser mudado para que isso funcione aqui?
A questão fundamental é a transferência. E não descobrir o que ‘funciona bem’ em outras sociedades. Então é essencial que ministros da Educação repentinamente empolgados, por exemplo com Xangai, não digam “eu encontrei o futuro e ele funciona”. A questão é como ‘Xangai’ funciona no Brasil. Essa é uma questão que nossos ministros da Educação não parecem ter perguntado a si mesmos seriamente. Eles se empolgam demais com o que viram ‘lá’; encontraram uma ‘solução’, uma pílula mágica.

Na sua visão, quais os desafios da educação profissional no mundo e no Brasil?
Interessantemente, um dos desafios, em especial para o Brasil, talvez, com sua história de colonização portuguesa, influência cultural francesa e influência política estadunidense é não depender de conselhos estrangeiros. Manter um diálogo internacional é outra coisa. Pouquíssimas sociedades são ainda ignorantes o suficiente hoje em dia – embora algumas estejam muito convencidas da própria retidão – para permanecerem fechadas internacionalmente. No entanto, buscar modelos no exterior não deveria, necessariamente, sempre identificar sucessos. Busque os fracassos! Essa pode ser uma forma muito inteligente de pensar sobre coisas, por parte do tempo, pelo menos. Tome cuidado: há diversas redes bem-sucedidas vendendo ‘soluções educacionais’ internacionalmente.
Importar educação não é como importar carros. O Brasil não precisa de vendedores (homens ou mulheres) propagandeando soluções ‘educacionais’, mas precisa de uma série de inúmeras Cassandras*, maravilhosamente educadas, muito alertas e analíticas.

*Nota do tradutor: Personagem da mitologia grega, uma dos 19 filhos do rei Príamo e da rainha Hécuba de Troia. É uma personagem de destaque na Guerra de Troia por prevê-la e alertar seu povo sobre as previsões de destruição. Foi, entretanto, desacreditada e considerada louca, devido a um desentendimento com o deus Apolo, que a amaldiçoou.

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